quinta-feira, setembro 06, 2007

Quick Fix

E eu sinceramente pensei que o sexo faria de mim alguém melhor porque faria de mim uma pessoa mais crescida. Depois, mais tarde quando me apercebi, o sexo era a minha droga preferida. A qualquer problema que surgisse o sexo aparecia como solução. Eventualmente também fui reparando que o efeito de "bem-estar" não resistia por muito tempo e, quando finalmente desaparecia, a má disposição era ainda pior. Não sentia o corpo, mas sentia-me suja. A pele cheirava a flores, mas metia-me nojo. E nas noites em que o adormecer não era imediato, os pensamentos do corpo, do tacto e dos gemidos de alguém que não conseguia olhar não desapareciam e o sono parecia evaporar-se.
Soube há muito que o sexo era pra mim uma droga e que, como todas as drogas, já não era saudável. Mas não conseguia parar. Na verdade nem o queria. Poderia não ser a melhor solução, mas fazia sentir-me bem por momentos e isso era a única coisa que desejava. Mesmo que fosse por breves momentos, já era algo. E era algo a que não estava disposta a renunciar. Não para já, não enquanto estivesse tão fraca, tão sem energias para querer encontrar outra solução. É que o querer exige a sua força e eu simplesmente não a tinha. O meu corpo andava, mas eu sempre estive estendida no chão.

Lara

quarta-feira, agosto 22, 2007

Início

data a estipular

Querido diário,

Lembro-me da minha mãe falar da noite em que nasci. Choveu e trovejou muito nessa noite, sabias? Lembro-me ainda que quando era mais nova achava piada a essa história porque ela teve muito medo. Costumava imaginá-la sozinha, só comigo ao colo, deitada na cama de um quarto grande e escuro pelo sol encoberto, à espera que o meu pai voltasse da rua para a confortar. E depois sorria por ter uma imaginação tão fértil. O quarto que imaginava era o da casa em que vivia e não onde nasci e o cenário que pintava era bem mais dramático do que o que na realidade teria sido.
Porém, agora que sou mais crescida e dizem que o meu pensamento é mais complexo, reflicto e questiono-me se essa noite tempestuosa será algum presságio. O que poderá significar uma tempestade na noite em que nasci? À medida que os anos passam e eu me vejo crescer julgo que essa tempestade definiu a minha vida.

Pode ser a adolescência, pode ser essa “fase” da qual os adultos falam e tanto gostam de mostrar que conhecem e percebem melhor do que ninguém. E eu ouço-os e vejo os seus sorrisos e pergunto-me se eles realmente se lembram de ser adolescentes. É que eu não julgo ser a única adolescente miserável e, pelo que leio, a adolescência no Ocidente é um período agitado, por isso, como podem eles falar de forma tão feliz da adolescência deles, ignorando todos os problemas que possam ter tido? Creio que não se lembram como se sentiram. Talvez a memória deles apague essas lembranças e só os factos permaneçam esmagando as emoções experienciadas.
Aceito que com o tempo vem a compreensão e que portanto a percepção da minha adolescência daqui a uns anos será bastante diferente da que tenho agora, até porque a analisarei com distância suficiente das emoções, ou seja, pensarei melhor. No entanto, custa-me a acreditar que quando chegar a adulta subvalorizarei todas estas sensações. Elas não são assim tão sem valor.

Bem, vou dormir que o amanhã começa as 8h30 com aula de Português. Estamos a dar poesia e eu tenho adorado cada aula. Até outra altura.

A tua única escritora,

Lara

quarta-feira, julho 12, 2006

Para sempre na memória

O tempo mudar-te-á. O tempo muda-te. Os teus defeitos tornar-se-ão exagerados. As tuas qualidades serão diminuídas. Tudo o que de apaixonante possuías e demonstravas desvanecer-se-á. Os teus belos olhos verdes, já não serão belos. A tua apetitosa boca carnuda, deixará de ser apetitosa. O teu porte masculino e atraente, não mais atrairá. Tudo porque já não serás segredo. Tudo porque os mistérios do teu corpo parecerão revelados e descodificados os caminhos do teu pensamento e previsíveis as tuas acções. O que de cativante existia, transformar-se-á em aborrecimento. Tu não serás o mesmo. Já não o és.
Mas a imagem que se acorrenta à (minha) memória é a do brilho dos teus olhos, do teu sorriso, é a lembrança do cheiro da tua pele, da suavidade da palma da tua mão, da tua face, é a recordação sonora da tua voz grave. Na minha memória ficarão gravados só pequenos instantes da tua presença. E será na tua ausência que eu recordarei os melhores momentos, os mais breves, aqueles a que o tempo não toca porque não se prolongam. Será na tua ausência que eu saberei o todo que tu és, pelo pouco que te sei. Será na tua ausência, na ausência da tua presença cativante e apaixonante, que eu recorrei aos instantes guardados na minha memória e me apaixonarei de novo e ignorarei o que o tempo te faz ser, o que a ausência de segredo me revela. É pela minha memória que eu te adoro e te adorarei acima de quaisquer transfigurações a que o tempo te sujeitará.

domingo, junho 25, 2006

Fernando Pessoa

Há quase um ano não 'screvo
Pesada, a meditação
Torna-me alguém que não devo
Interromper na atenção.

Tenho saudades de mim,
De quando, de alma alheada,
Eu era não ser assim,
E os versos vinham de nada.

Hoje penso quanto faço,
'Screvo sabendo o que digo...
Para quem desce do espaço
Este crepúsculo antigo?


1932

sábado, novembro 12, 2005

Sonho do fantástico

Esta noite tive um sonho engraçado
Sonhei que vivia num mundo de fantasia
Onde habitavam fadas, feiticeiros e gnomos
E todos viviam em comunidade, satisfeitos
Eram felizes e espalhavam em seu redor um pó
Um pó mágico, um pó dourado, o pó da felicidade
E eu fui invadida por esse pó sublime
Só pude sentir alegria, pois era ainda muito densa
E a alegria é menor que a felicidade porque é efémera
E eu sou menor que esses habitantes porque sou rude
Porque ainda choro, e invejo, e tenho raiva, e egoísmo
Porque maltrato, e desejo, e possuo, e me prendo
Apesar disso começava a sentir a leveza daqueles seres
A cada passo, a cada inspirar, a cada sorriso, a cada olhar
De cada pedacinho daquele mundo que me entrava no corpo
Pelos poros, pela boca, pelos ouvidos, pelos olhos adentro
Eu sentia-me parte deles, parte daquela fantasia
E era bom saber que a minha presença não incomodava
Era bonito ver a sua serenidade e hospitalidade
E gnomos, feitceitos e fadas aproximavam-se de mim
E eu não receava e eles sorriam e eu sorria e não havia som
Apenas a sensação que englobava todas as outras sensações
E eu via-os e eles viam-me e também não me receavam
Porque estavam naquele mundo e eram felizes e sábios
E porque só da sabedoria se parte para a felicidade
E eu, priveligiada por partilhar um pouco da magia,
Acordei suavemente de sorriso leve e ainda alegre
E guardei em mim a esperança de um outro mundo

11 e 12 de Novembro de 2005

quinta-feira, outubro 20, 2005

Chocolate quente

Hoje fui a Sintra e bebi um chocolate quente. Hmm... soube-me tão bem! Há que tempos que sonhava com aquele sabor e aquela textura! Soube ainda melhor porque o tempo assim o fez saber; esteve um dia cinzento e de vez em quando chovia fortemente, o frio fazia-se sentir, se bem que não muito. Um dia perfeito para um chocolate quente! Eu e o meu cachecol de riscas largas mais um cigarro light nos dedos e um livro na outra mão numa tarde que parecia de Inverno.

Ando a ler Bernardo Soares. Já há muito que queria acabar de ler o "O Livro do Desassossego", mas os indesejados inconvenientes afastaram-me os sentidos deste livro maravilhoso. E foi, exactamente quando acabei de ler a introdução do editor, que interrompi. Agora voltei à sua leitura e é realmente fascinante! Preenche-me... Sem dúvida que irá para a minha lista de favoritos; favorito não será bem a palavra mais ajustada, mas sim marcante; será um livro marcante, com certeza.

Passeei cerca de uma hora pelo centro da cidade. Explorei as ruelas e visitei várias lojas! Demorei-me a apreciar a beleza daquela cidade tão romântica (romântica-romântica e não no sentido banal que dão agora à palavra). A vegetação, o ar, as fontes, os turistas (porque até nesta altura os há), o movimento... tudo me conferiu uma paz que há muito ansiava. Depois, demorei-me cerca de hora e meia no castelo e, de seguida, no palácio da Pena que ainda é o que mais me fascina; tanta cor, tanta vida, tanto mistério que se respira naquele nevoeiro cerrado! Uma beleza eterna parada no tempo. A meia hora que restou da minha estadia passei-a no "cafezinho dos chocolates quentes", como já lhe chamo. A beber e a ler, aconchegando o cachecol ao pescoço e mergulhando a alma nas palavras de Soares.
Deixei-me ficar até por volta das 16h30, hora em que paguei, arrumei as minhas coisas e dei início à viagem de regresso a casa, com quem partilho a alegria de me ver ajeitar confortavelmente no sofá e conversar com as paredes. Soube-me bem a ida a Sintra, mas também sabe muito bem o regresso a casa. Por isso, adoro os dias cinzentos; dão um outro aspecto às coisas. Comigo, têm tendência a espalhar conforto em redor.

P.S. Queimei a língua... o chocolate estava demasiado quente. Ainda assim, vou sonhar com aquele sensação inverniça que o aroma e o sabor doce construíram...

terça-feira, outubro 18, 2005

Mentismo

A única coisa que prometo é a de que vou morrer e nascer outra vez, mas não prometo que estas serão páginas de um diário diário; nem prometo ser interessante, nem prometo ser fácil de ler e compreender; não prometo encher nem satisfazer, não prometo sequer cativar. E uma última coisa, que eu, de facto, gostaria de prometer mas não posso, é a de que não prometo ser coerente. Sou uma personagem fictícia ainda por definir.

Quanto mais penso mais o vazio me invade ao contrário do que seria de esperar. O cansaço pesa-me nos olhos, no pescoço, na cabeça, em todo o corpo. Dói-me a cabeça e não consigo parar de pensar. Penso, tudo flui e nada se fixa. E dói-me a cabeça. E as palavras deixam de surgir...